No sábado passado o tempo esteve fabuloso, apareceu um público muito interessado e participativo, e depois da tosquia feita pelo Martin, as ovelhas estão mais fresquinhas e nós temos uns belos velos de Bordaleira-de-Entre-Douro-e-Minho para trabalhar. Ou seja, foi uma manhã perfeita.

Antes do evento, pedi ao Marty e à Suzana para fazerem uma boa introdução ao que ia acontecer. Resumir o background do Marty, explicar para que serve e o que implica uma tosquia, falar das ferramentas e da técnica usada. Uma abordagem que mostrasse como se faz uma boa tosquia num ambiente profissional e actual, mesmo que em pequena escala, era o mais importante, e também explicar que sendo a ovelha um animal domesticado, temos obrigações a cumprir para manter o seu bem-estar, e a tosquia é uma delas.

O Marty, que é natural da Nova Zelândia, cresceu numa quinta com milhares de ovelhas e foi aos 18 que foi mandado pelo pai para uma escola de Tosquia - facto que não lhe agradou muito na altura, mas o sentimento agora é outro. Trabalhou e trabalha na indústria lanar tanto na NZ como na Austrália, mas também por toda a Europa, incluindo Inglaterra, Escócia, Suiça, Itália, etc.
Neste momento reside em Portugal com a Suzana, em Marvão, onde continua a trabalhar como tosquiador tanto no nosso país, como fora, em diferentes épocas do ano.
Uma das coisas que torna o Marty interessante para mim, e para a investigação que estamos a fazer, é a sua experiência comparativa. O facto de trabalhar em países com indústrias lanares bem distintas e "culturas da fibra" também ela distintas dá-lhe uma visão interessante do assunto. As diferentes abordagens, os diferentes objectivos, as diferentes expectativas de cada sítio. 
Em Portugal, tem tosquiado principalmente na zona do Alentejo.
Por aqui, diz ele, a grande diferença é que o objectivo dos criadores e tosquiadores em geral é simplesmente aliviar a ovelha da lã, e não a obtenção da fibra têxtil com qualidade, que exige cuidados específicos. Na maior parte dos casos não se faz sequer a desbordagem dos velos logo após a tosquia, e muito menos a separação da lã pela qualidade da fibra (o "wool grading"), o que faz baixar o valor da lã por haver uma mistura de produtos de fraca qualidade com outros de alta qualidade.
Também acha que há uma percepção errada quanto à qualidade da lã que produzimos em Portugal. A nossa lã é muito melhor que aquilo que os portugueses pensam, e por cá há raças bem interessantes para serem exploradas. Outro ponto a melhorar são os cuidados prestados às ovelhas durante todo o ano que antecede a tosquia. Tudo começa aí, a lã é um reflexo do bem-estar do animal.

Este sábado foi a primeira vez que tosquiou ovelhas Bordaleiras-de-Entre-Douro-e-Minho e não deixou de dizer que adorou tanto a sua personalidade, que classificou como "very nice sheep", como a qualidade da lã também.
O maior feedback de quem assistiu foram os elogios à forma delicada, mas segura e eficaz, como o Marty manuseou os animais, e também, acima de tudo, como o processo foi tão calmo e pacífico, o que me pareceu criar muita surpresa entre o público, como se pôde ver pelo silêncio durante a tosquia da primeira ovelha e as palmas quando a Suzana abriu o primeiro velo para toda a gente tocar.

A mim surpreendeu-me pela positiva o tipo de perguntas colocadas pelo público após a tosquia da primeira ovelha. Perguntas pertinentes e muito interessantes, a meu ver, todas relacionadas com os aspectos práticos e económicos da actividade: "como é que se armazena esta lã assim suja?", "Que tipo de lã é a desta raça?", "como é que se lava o velo?", "Quanto é que pesa o velo e quanto lã é que rende depois de lavada?", "Aproveita-se toda a lã do velo?" e outras semelhantes. Perguntas que penso mostrarem que a apresentação do assunto por parte do Marty e da Suzana foi bem interessante, e que tirou muita gente do simples papel de espectador para passarem a querer perceber mais do assunto.

Ainda quero aqui falar da técnica específica de tosquia usada pelo Martin - a técnica Bowen, e também da forma como se faz a desbordagem e o armazenamento correcto dos velos tosquiados, o que farei nos próximos posts.

Tosquiador de Ovelhas
Marty & Suzana
T: 968152967
Marvão, Portugal



[09.05.2015 / Este post refere-se à investigação e actividades desenvolvidas no âmbito do programa Saber Fazer em Serralves ]

The shearing

Last saturday we had fabulous weather, an interested audience showed up, and after the nice shearing done by Martin, the sheep are now much lighter and we have some beautiful fleeces from the Bordaleira-de-Entre-Douro-e-Minho to work with. It was a perfect morning.

Before the event, I asked Marty and Suzana if they could make a good introduction to what was about to happen. Talk about Marty’s background, explain the purpose of the shearing and what it implies, the tools and the technique used. An approach that showed how a good shearing in done in a professional environment, even if small scale, was the most important, and also convey the idea that sheep are domesticated animals, and therefore we have an obligation of assuring their well-being, and shearing is a part of that.

Marty, born in New Zealand, grew up in a farm with thousands of sheep and at the age of 18 was sent by his father to a shearing school - something he didn’t like at the time, but the he has different feelings about that now. He has worked and still works in the wool industry, both in NZ and Australia, but also all over Europe, including England, Scotland, Switzerland, Italy, etc.
At the moment he lives in Portugal with Suzana, in Marvão, where he keeps working as a shearer, both in our country and abroad, in different times of the year.
One of the things that makes Marty so interesting for me and the investigation we’re carrying, is his comparative experience. The fact that he has worked in countries with very different wool industries and “fiber cultures” allows him to have an interesting view on the subject. The different approaches, different goals and different expectations of each place.
In Portugal he has been shearing mainly in Alentejo.
He tells me that around here the main difference is that the goal of the shearers in general is simply to relieve the sheep from its wool, and not obtaining the wool for fiber purposes, which demands specific care. In most cases, the fleeces aren’t skirted and no wool grading is done, and this lowers the wool value, simply because the low quality product is being thrown together with the high quality one.

This saturday was the first time he sheared Bordaleiras-de-Entre-Douro-e-Minho sheep (a local breed from northern Portugal) and his comments about them were that they were “very nice sheep” and that they had good wool.
The biggest feedback from the audience were the compliments to the delicate, yet confident and firm way, as Marty handled the animals and above all, how calm and peaceful the whole process was, which seemed to surprise a lot of people, as I could see from the silence during the first shearing and the applause when Suzana opened the first fleece for everyone to see and touch.

I was pleasantly surprised by the type of questions asked by the audience after the first sheep was sheared. Interesting and important questions, all related with the practical and economical side of the activity: “how do you store the raw fleece?”, “What kind of wool is this?”, “How do you wash the fleece?”, “How much does this fleece weight and how much wool will it give after washing?, “Do you use all the wool from the whole fleece?” and others very similar. I think these questions show that Marty and Suzana’s approach to the subject was interesting, and many people were interested in much more that just watching.

I still want to talk about the shearing technique Marty uses - the Bowen technique - and also about skirting the fleece and how to properly store a raw fleece, but I’ll do that in the next posts.
 

Tosquiador de Ovelhas (Sheep Shearer)
Marty & Suzana
T: 00351 968152967
Marvão, Portugal

[09.05.2015 / This post refers to the investigation and activities developed during the Saber Fazer em Serralves program]


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